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Mão seleciona uma figura de madeira sorridente de uma série de figuras neutras, em um contraste que realça s perfis diferentes e a escolha individual

Tomar decisões acertadas sobre perfis de investimento: desafio que exige educação e estratégia

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Equipe APEP
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No artigo de Fernando Henrique Palermo, Gestor Portfolio Solutions da Icatu Vanguarda, são abordadas as armadilhas comportamentais que afetam a escolha de perfis de investimento por parte dos participantes dos fundos de pensão.

A análise destaca a tendência de decisões baseadas em rentabilidade passada, o impacto da quantidade excessiva de opções, o papel das janelas de migração e a importância da educação financeira.

A adoção de perfis ciclo de vida e estruturas simplificadas também aparece como solução viável para mitigar vieses e promover escolhas mais alinhadas ao longo prazo.

Leia aqui o artigo completo:

Perfis de Investimento e Comportamento do Participante

Introdução

Nos fundos de pensão brasileiros, muitos planos de Contribuição Definida (CD) adotam perfis de investimento para que os participantes escolham a alocação de seus recursos de acordo com seu apetite ao risco. Em geral, os perfis vão do conservador (priorizando renda fixa e menor volatilidade) ao agressivo (maior parcela em renda variável), podendo incluir níveis intermediários ou opções de ciclo de vida conforme a idade do participante. O objetivo é permitir que cada pessoa ajuste seus investimentos previdenciários às suas necessidades e tolerância a risco. Contudo, essa liberdade de escolha traz desafios comportamentais: muitos participantes tendem a decidir baseando-se em rentabilidades passadas. Sem a devida orientação, essas decisões podem ser prejudiciais ao patrimônio previdenciário de longo prazo. Além disso, há um debate sobre quantos perfis oferecer – tanto a falta de opções quanto o excesso delas podem atrapalhar a tomada de decisão dos investidores.

Atualmente, nem todas as entidades oferecem múltiplos perfis. Um levantamento de 2022 apontou que 39% das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC) não possuíam perfis de investimento diferenciados (operavam com um portfólio único para todos), enquanto 35% já ofereciam perfis aos participantes. Das entidades que ainda não adotavam perfis, 26% estavam avaliando implementar essa estrutura. Isso mostra uma tendência de ampliação do modelo de perfis, porém também indica que uma parcela significativa dos fundos de pensão mantém estratégias unificadas de investimento (seja por características dos planos, porte da entidade ou preferência por simplificar as decisões dos participantes). Diante desse panorama, torna-se importante discutir como os participantes têm se comportado frente à escolha de perfis e quais práticas de educação financeira e desenho de opções podem conduzir a melhores resultados previdenciários.

Rentabilidade passada na escolha de perfis

Um erro comportamental comum entre investidores – inclusive participantes de fundos de pensão – é escolher ou trocar o perfil de investimento com base na performance passada, acreditando que retornos recentes vão se repetir. Essa reação impulsiva desconsidera que os ciclos de mercado variam e que alterações baseadas em horizontes muito curtos podem levar a perdas irreversíveis no longo prazo.

O problema é que ficar trocando de portfólio com frequência em busca do melhor desempenho recente pode na verdade reduzir o retorno alcançado, ficando abaixo da média ao longo do tempo.

No contexto dos planos previdenciários, há evidências práticas desses comportamentos. Durante a forte volatilidade de março de 2020 (início da pandemia de Covid-19), diversas fundações relataram uma corrida de participantes querendo migrar dos perfis moderado ou agressivo para o perfil conservador, logo após os perfis arrojados sofrerem perdas. Esse é um típico caso de tomar uma decisão drástica olhando o desempenho recente negativo. Gestores tiveram de intervir com comunicação e orientações claras para desestimular mudanças abruptas de perfil, alertando que tal migração naquele momento poderia travar prejuízos que seriam recuperáveis adiante. Com regras que permitiam trocas semestralmente; muitos participantes que queriam sair dos perfis de risco em março tiveram que aguardar até outubro, ganhando tempo para reconsiderar com calma – e de fato o trabalho educativo neste intervalo ajudou a evitar uma movimentação prejudicial em massa. Esse exemplo ilustra como mecanismos de governança (janelas de alteração infrequentes) aliados à educação podem proteger o participante de si mesmo, inibindo o  calor do pânico de curto prazo.

De forma semelhante, em ciclos de alta, os gestores recomendam cautela contra euforia excessiva. Ao invés de trocar de perfil por causa de resultados recentes, o participante deve avaliar sua estratégia de longo prazo e manter-se fiel a ela. Alterações motivadas por movimentos de curtíssimo prazo tendem a ser prejudiciais – exatamente aquilo que se viu em 2020, quando quem permaneceu no perfil de maior risco acabou recuperando as perdas à medida que os mercados se recuperaram, enquanto quem migrou no pior momento consolidou o prejuízo. O antídoto é focar nas perspectivas de longo prazo e na adequação do perfil ao seu objetivo previdenciário, e não às oscilações momentâneas.

Importância da educação financeira na decisão do participante

Diante dos vieses comportamentais mencionados, torna-se clara a importância da educação financeira para auxiliar os participantes na escolha consciente de seus perfis de investimento. Diferentemente de um investidor profissional, o trabalhador médio muitas vezes não possui conhecimento aprofundado em finanças – e mesmo aqueles com algum conhecimento podem tomar decisões emocionais. Programas de educação financeira e previdenciária buscam suprir essa lacuna, ensinando noções de risco e retorno, diversificação e planejamento de longo prazo, de modo que o participante tenha segurança para tomar decisões informadas e coerentes com seus objetivos de aposentadoria.

Muitas fundações têm investido em comunicação transparente e iniciativas educativas, especialmente durante os períodos de troca de perfil (que geralmente ocorrem uma ou duas vezes por ano). Nessas comunicações, enfatiza-se que a decisão deve ser tomada “de forma consciente e buscando conhecimento, pois comparar as rentabilidades passadas não necessariamente retrata o futuro dos investimentos”. Além disso, os participantes são encorajados a utilizarem ferramentas como questionários de perfil de investidor (para avaliar sua tolerância a risco e horizonte de investimento) e a consultarem materiais didáticos disponibilizados pelos fundos de pensão.

Essa mensagem resume bem o papel da educação financeira: capacitar o participante a identificar, dentre as opções disponíveis, aquela que melhor se alinha ao seu caso particular. Um jovem no início de carreira, por exemplo, talvez devesse permanecer num perfil mais arrojado mesmo após um ano ruim, pois seu horizonte permite recuperar-se e ele busca crescimento de longo prazo; já alguém prestes a se aposentar pode priorizar perfis mais conservadores para proteger o saldo, mas entendendo os trade-offs (rentabilidade menor em troca de estabilidade).

Vale notar que conhecimento financeiro não elimina completamente os vieses, mas certamente os atenua. Por isso, além de educar, os fundos de pensão e consultores atuam na arquitetura da escolha: criando estruturas de decisão que facilitem a vida do participante, conforme veremos a seguir.

Quantidade de perfis: qual o número ideal?

Oferecer opções de perfis de investimento aos participantes envolve um equilíbrio delicado. Por um lado, ter perfis distintos é importante para atender à diversidade de perfis de risco e situações dos participantes – jovens x aposentandos, avessos x tolerantes ao risco, etc. Por outro lado, o excesso de opções pode gerar confusão e indecisão. Na indústria de fundos de pensão e planos internacionais, já se observou o fenômeno da choice overload: quando confrontadas com um leque muito amplo de investimentos, as pessoas tendem a paralisar ou recorrer ao default (opção padrão) por não saberem escolher. Mesmo participantes experientes acabam utilizando o fundo default com mais frequência quando aumenta o número de fundos oferecidos, possivelmente por ficarem indecisos diante de muitas alternativas parecidas – e o problema é que o default muitas vezes é conservador demais para quem ainda está acumulando recursos. Em resumo, mais escolha não significa necessariamente melhor resultado; passado um certo ponto, pode atrapalhar a tomada de decisão informada.

Nas EFPCs brasileiras, o modelo mais comum de perfis envolve três a cinco opções, normalmente com nomenclaturas como Conservador, Moderado, Agressivo (às vezes incluindo um Ultraconservador ou um perfil Ciclo de Vida). Há fundos que experimentaram ampliar demais esse leque ou criar subdivisões que acabaram sendo pouco utilizadas pelos participantes. O aprendizado setorial indica que vale evitar excesso de perfis que possa gerar dúvida ou redundância – se as diferenças não forem claras, o participante pode acabar escolhendo mal ou simplesmente permanecer no perfil default por inércia.

Por isso, muitas entidades buscam definir um número “ideal” de perfis que equilibre personalização e simplicidade. Em geral, três ou quatro perfis bem distintos costumam atender à maioria, oferecendo desde a segurança máxima até o potencial de retorno mais alto, com opções intermediárias de equilíbrio. Há casos em que ajustes são feitos conforme a demanda e entendimento dos participantes. Por exemplo:

  • Fundo X (hipotético): possuía quatro perfis de investimento, porém dois deles apresentavam baixa adesão ou diferenças pouco significativas. A entidade avalia reduzir para apenas dois perfis – um conservador e um agressivo –, simplificando a escolha. Acredita-se que assim os participantes se enquadrariam mais claramente em um dos perfis, diminuindo a confusão na hora da migração. Além disso, a gestão dos investimentos se torna mais eficiente com menos carteiras para administrar.
  • Fundo Y (hipotético): ainda não adota o modelo de perfis, mantendo uma carteira única que equilibra risco e retorno para todos os participantes. Essa estratégia “tamanho único” pode funcionar em planos menores ou com população homogênea, mas pode deixar de atender adequadamente extremos do espectro de risco (jovens x sêniores). Sabendo disso, a entidade estuda implementar perfis no futuro para dar mais flexibilidade – seguindo a tendência setorial onde um quarto das entidades sem perfis já consideravam adotá-los. Enquanto não o faz, o Fundo Y procura gerir a carteira única de forma balanceada e comunicando aos participantes que o perfil de investimento é único, cabendo à fundação fazer os ajustes de risco conforme a conjuntura.

Ambos os cenários ilustram a busca pelo ponto ótimo. Simplificar demais (uma única carteira para todos) pode ignorar diferenças importantes entre participantes; já complexar demais (muitos perfis) pode sobrecarregar o participante médio e até os mais sofisticados. Uma alternativa que vem ganhando espaço é o perfil ciclo de vida (ou data-alvo), em que a própria estrutura do plano ajusta automaticamente a alocação conforme a idade do participante – reduzindo o risco conforme a aposentadoria se aproxima. Essa abordagem diminui a necessidade de o participante tomar decisões frequentes, servindo quase como um “piloto automático” alinhado com princípios de alocação por idade. Alguns planos setoriais no serviço público e entidades privadas têm adotado versões disso, segmentando perfis por faixa etária ou horizonte de aposentadoria.

Do ponto de vista executivo, definir o número de perfis também envolve custo-benefício administrativo e regulatório. Cada perfil implica uma carteira segregada, metas e políticas de investimento específicas, acompanhamento de performance e comunicação dedicada. Excesso de perfis aumenta complexidade operacional e a necessidade de governança (por exemplo, garantindo que um perfil não favoreça indevidamente um grupo em detrimento de outro). Portanto, evitar a proliferação desnecessária de perfis é uma boa prática de gestão. A Resolução do Conselho Nacional de Previdência Complementar que permitiu a criação de perfis deixou a cargo de cada EFPC a decisão, e o Guia de Melhores Práticas da Previc recomenda avaliar criteriosamente a aderência dos participantes a cada perfil e o entendimento deles sobre as opções antes de criar novos perfis ou manter muitos deles simultaneamente (referência às melhores práticas gerais do setor).

Conclusão

A experiência dos fundos de pensão com perfis de investimento mostra que oferecer escolha é importante, mas não suficiente – é preciso orientar o participante para que a utilize sabiamente. O comportamento impulsivo de olhar retornos recentes ou seguir o fluxo da maioria pode minar os benefícios da flexibilidade de escolha, levando a decisões erradas e comprometendo a rentabilidade de longo prazo do plano previdenciário. Para mitigar isso, educação financeira constante e comunicação transparente se revelam essenciais: participantes bem informados tendem a compreender melhor os riscos, resistir à tentação de ajustes precipitados e alinhar suas decisões com seus objetivos de aposentadoria.

Do lado dos patrocinadores e gestores, a responsabilidade está em desenhar estruturas de plano acessíveis e resilientes aos vieses. Isso inclui definir um conjunto de perfis de investimento em um número adequado e com perfis bem delineados, de modo que cada participante consiga se identificar com uma opção sem ficar perdido em excesso de informações. Simplificar as escolhas – por exemplo, reduzindo opções muito similares e destacando a opção default apropriada – pode melhorar os resultados, pois evita sobrecarga de informação que leva à inércia ou escolhas subótimas.

Em última análise, o sucesso de um modelo de perfis de investimento se mede por quão bem os participantes conseguem navegar por ele. Isso significa: participantes fazendo escolhas racionais, consistentes com seu perfil de risco e idade, e permanecendo nelas a menos que haja mudança genuína de objetivos. Quando educação financeira e arquitetura de escolha andam de mãos dadas, cria-se um círculo virtuoso: o participante entende os benefícios de manter uma disciplina de investimento, evita cair nos erros clássicos de olhar apenas o desempenho passado, e os gestores podem, assim, oferecer algum grau de autonomia sem comprometer a segurança de longo prazo.

Para os executivos e consultores de fundos de pensão, ficam algumas lições práticas deste debate: (1) monitore o comportamento dos participantes em relação aos perfis (fluxos de migração, dúvidas recorrentes) para identificar necessidades de intervenção educacional; (2) avalie periodicamente se a quantidade e definição de perfis no plano continuam adequadas – ajuste se necessário, seja incorporando um perfil ciclo de vida, fundindo perfis pouco utilizados ou criando material explicativo mais claro; (3) reforce mensagens-chave na comunicação, como a de que rentabilidade passada não garante futuro, de que decisões devem considerar o longo prazo (horizonte de investimento) e o objetivo individual; e (4) lembre-se de que muitas vezes menos é mais – menos ruído, menos complexidade – para que o participante foque no que realmente importa: construir, com serenidade e conhecimento, a sua aposentadoria digna.

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