Muitos mais que os desafios operacionais e financeiros do próprio segmento, agora os fundos de pensão precisam também refletir sobre seu compromisso e ações com relação ao meio ambiente e às temáticas sociais e de governança. É o que o termo ASG (Ambiental, Social e Governança – em inglês Environmental, Social and Governance) trouxe à tona como desafio para o meio corporativo.
Em entrevista especial, Felinto Sernache Coelho Filho, Membro do Conselho Consultivo da APEP e Retirement International Leader na WTW, traz alguns insights sobre o tema, que merecem certa urgência, entenda o porquê.
FSGF: Pelas razões que temos acompanhado todos os dias nas notícias. As metas de redução de carbono e limitação do aquecimento global previsto no Acordo de Paris parecem não serem possíveis de serem atingidas.
Diante disso, as obrigações econômicas trazidas no regulatório dos principais mercados começaram a chegar por aqui.
Mas percebo que as empresas e os investidores institucionais brasileiros estão encarando essas obrigações como algo a ser mudado no futuro. No entanto, identificamos que novas obrigações que irão afetar os resultados financeiros das empresas irão aportar por aqui em pouco tempo. Por isso, é tão importante entender e seguir com as mudanças necessárias.
FSGF: Sim, inclusive realizei uma explanação em evento recente da APEP em que propus uma visão pragmática e trouxe ainda um ponto de atenção, a questão do aquecimento global: as obrigações para corporações, fundos de pensão e gestores de investimentos.
Esse é um exemplo claro, o Acordo de Paris, que pretendia limitar o aquecimento global a uma alta de até 1,5 ºC, já tem dado sinais claros de fracasso. Diversos estudos já apontam que o planeta deve atingir esse limite até 2030.
Essa variação já impacta com a agressividade nas temperaturas, os níveis dos oceanos subindo e o mar avançando, ou seja, é uma questão de atenção global.
Diante disso, qual é o nosso compromisso com esse acordo e com o que foi assumido? Quais ações os que os investidores institucionais estão tomando e quais as obrigações que devem constar nos balanços das empresas? Precisamos refletir e começar a pensar nas mudanças necessárias.
FSGF: Sim. Na WTW do Reino Unido foi criado um setor exclusivamente dedicado para a oferta de serviços que ajudam os clientes a se enquadrarem nas regras que estão surgindo nos principais mercados. Um deles ajuda na revisão do portfólio de investimentos do Fundo de Pensão, com base numa metodologia que apura o valor presente da empresa com ação negociada em bolsa, tendo ela aderido ou não às novas diretrizes. E vale reforçar que o valor da empresa muda brutalmente. Portanto, temos que estar à frente.
FSGF: Vejo o mercado brasileiro à espera de uma regulamentação por parte da CVM, embora já exista um regramento do Banco Central nesse sentido para a área de crédito.
Na Europa, por exemplo, os fundos de pensão terão que se enquadrar gradualmente até 2025.
Penso que devemos assumir uma postura mais pragmática, nos anteciparmos as medidas que estão por vir e iniciarmos ainda nesse ano um diálogo com os assessores de investimentos para a construção / revisão do portfólio que contemplem ações de empresas que estão firmemente comprometidas com as metas ambientais.
Haverá em 2023 um momento em que o tema vai emergir para a aderência aos investimentos e aí as pessoas vão começar a se preparar. Mas, já era para estarem preparadas. Isso já precisa ocorrer a partir de agora.
FSGF: Penso que rentabilidade e as regras contábeis trazidas pelo regramento da ASG tem pontos de convergência.
Os gestores de Fundos de Pensão têm por dever de ofício buscar o melhor equilíbrio no risco/retorno dos investimentos.
As empresas com ações negociadas em bolsa terão que se enquadrar no regramento que já está aportando por aqui. Essas novas obrigações contábeis irão afetar o valor presente dessas empresas e por consequência o valor das ações negociadas no mercado.
Diante desse desafio, os investidores institucionais precisam efetuar um trabalho detalhado para fazer uma seleção criteriosa das ações das empresas aderentes ao novo regramento.
FSGF: Penso que esse é um caminho necessário, sem volta e que deve ser iniciado com brevidade. Um diálogo com o assessor de investimentos da Entidade é o primeiro passo nesse sentido.
FSGF: O mercado já oferece e deve aumentar a oferta de fundos de investimentos com esse perfil de empresas. Entretanto, as regras de transição na montagem das carteiras de investimentos devem ser observadas para evitar perdas nos investimentos.
FSGF: Claro. As questões trazidas pela ASG atravessam toda a sociedade, afinal todos, sem exceção, já estamos sofrendo as implicações das mudanças climáticas.
Os Fundos de Pensão podem e devem adotar medidas que visam a meta “carbono zero” nas suas atividades, tais como uso consciente da energia, da água, do papel da impressora, aproveitamento do calor produzido pelos computadores, contratação de fornecedores com “selo verde” em suas atividades, entre outras medidas.
FSGF: A APEP já está fazendo a sua parte. Ela promoveu recentemente um debate sobre o tema. E deve continuar a promover essa discussão de alto nível na medida em que o regramento contábil seja divulgado pelo Banco Central, CVM e outros órgão reguladores.
Com mais de 35 anos de experiência em consultoria atuarial e estratégica para benefícios, atualmente Felinto lidera a linha de negócios de Retirement para a geografia Internacional – Ásia e Australásia, CEEMEA e América Latina. Além disso, atua como consultor em projetos especiais de alta complexidade em empresas nacionais e multinacionais de grande porte.
Felinto juntou-se à WTW em 1991 como consultor em projetos da área de aposentadoria. Ao longo de sua trajetória na empresa, exerceu diversas posições de liderança no Brasil. De 2011 a 2015 acumulou as funções de líder do segmento de Benefícios e Diretor Geral das operações no país, com uma gestão fortemente focada nos resultados do negócio no Brasil, no engajamento e produtividade dos associados e no relacionamento com clientes. De 2016 a 2021, liderou a área de Retirement para a América Latina.
Felinto possui grande experiência em processos de fusões e aquisições, especialmente em projetos de integração e harmonização de políticas de RH e benefícios.
Profissional renomado no mercado da Previdência Complementar no Brasil, Felinto é conferencista em eventos de destaque no setor. Por dois anos consecutivos (2014 e 2015) foi eleito o Consultor Atuarial do Ano pela Revista Investidor Institucional. Na WTW, também é membro do Comitê de Diversidade de Inclusão da América Latina.
Na APEP, Felinto é Conselheiro Consultivo desde 2011.